Entrevista exclusiva: o vírus que abalou o mundo

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Encontrei Sars-CoV-2 em uma suíte do Plaza Hotel, em New York. A segurança do vírus marcou e desmarcou várias vezes o encontro, mudando o local. Com a saída de Trump da Casa Branca, o vírus passou a ser perseguido em todo o mundo e corre risco de morte.

Na antessala da suíte, vesti uma roupa de segurança parecida com a dos astronautas – macacão, luvas, capacete e botas de borracha. Fui revistado dos pés à cabeça, para ver se não carregava ampolas e seringas.

Desde que as vacinas começaram a ser aplicadas, Sars reforçou a sua segurança e agora anda em companhia de pelo menos 15 variantes, todas cepas de alta periculosidade.

Para poder entrevista-lo assinei uma declaração de que não havia sido vacinado e nem infectado, além de apresentar todos os testes sorológicos.

***

Quando entrei na suíte, Sars estava sozinho, sentado numa poltrona à janela, apreciando a paisagem do Central Park coberto pela neve.

– O Parque está vazio por causa da nevasca da manhã, mas quando chegar o verão, em junho, continuará vazio por causa do novo lockdown, ele me disse pensativo.

De onde eu estava, não conseguia vê-lo. Soube que as variantes estavam em um quarto ao lado. Podia escutar o barulho que faziam. Pareciam ouvir uma música alta, talvez um funk.

– Até lá teremos a população toda vacinada e vocês deixarão de ser um pesadelo, eu disse, me arrependendo logo de tê-lo provocado.

Eu estava lá como repórter e não como um comentarista da Globonews. Tinha que respeitar o meu entrevistado.

Sars girou sua poltrona em minha direção e pude vê-lo pela primeira vez. Era uma bolota vermelha, como a apresentada nos infográficos da imprensa, toda cravejada de hastes. Parecia a bolinha da Sol, a minha golden retriever, só que bem maior.

– É o que veremos, respondeu o vírus, como uma voz ameaçadora. Tenho pelo menos 15 variantes para entrar em ação, que vão deixar os epidemiologistas da tv em polvorosa. As vacinas vão ser refrescos para nós.

– Vamos começar, posso gravar?

– À vontade, esta é a primeira entrevista que concedo à imprensa ocidental. Há um ano, fui entrevistado por um jornal de Pequim. A pandemia tinha acabado de começar, mas o governo chinês censurou a matéria.

– E por que resolveu dar sua primeira entrevista à um jornalista brasileiro?

– Simpatizo com o governo do seu país. Acho todos muito divertidos, principalmente o general estrategista, o ministro da Saúde, o tal de…

– Pazuello, respondi.

– Sim, grande figura! Ele foi o responsável por uma grande variante, a de Manaus, que vai nos permitir um avanço notável na guerra contra as vacinas. Esta nova cepa é genial, gosta de música sertaneja, aglomeração e açaí. Tá na suíte ao lado.

Começamos.

***

Pergunta – O senhor gosta do governo Bolsonaro?

Sars – Muito. Só me sobraram eles. O Trump fez aquela cagada do Capitólio e o Biden encheu o país de vacinas. Está muito perigoso para os vírus andarem por este país agora. Temos que usar máscaras, não podem nos aglomerar e precisamos encontrar novas variantes.

Pergunta – E no Brasil?

Sars – Seu país é uma farra. Muito divertido. Um paraíso para vírus, bactérias, o diabo. Adoro ver aqueles comentaristas de tv sempre falando as mesmas coisas. O Datena, dando uma de doutorzinho. O cara de bolacha dizendo que o Bolsonaro passou dos limites. Ele repete isso todos os dias. E o cara da calça apertadinha, como chama mesmo?

Pergunta – Doria. É esse?

Sars – Isso mesmo, o Dória. Amigo da ciência, né? O Bolsonaro não suporta ele!

Mas me restaram os negacionistas brasileiros. O Bolsonaro não queria a vacina, só a cloroquina. Adoro cloroquina. Tomo toda a noite uma dose, com tônica, limão e gelo. Delícia! Você devia ter me trazido algumas garrafas. Aqui não tem.

Pergunta – Bolsonaro é contra a vacina e não usa máscara.

Sars – Sim, mas melhor que ele é o general Pazuello. Estou pensando em contratá-lo. É especialista em espalhar vírus e atrasar compra de vacina. Precisamos de gente assim para invadir o mundo inteiro. Também quero aquela deputada federal, a Bia Kicis, maravilhosa! Tenho vontade de agarrá-la e infectá-la toda. Gostosa! Mulher de atitude. Ela poderia ser a diretora de marketing da Covid Company, multinacional que pretendo montar para defender os interesses internacionais dos vírus e bactérias. Já pedi a ela pra fazer o meu perfil no twitter. A Paulinha Lavigne vai fazer a minha primeira live.

Pergunta – Qual é a razão de o senhor ter se tornado uma grande pandemia?

Sars – A burrice, o negacionismo e o vocação das pessoas pelo gregarismo! O pessoal não consegue ficar em casa quietinho, tomar um leitinho e ver série da Netflix, como a Arlene. Veja as redes sociais. Está cheia de videos de pessoas se aglomerando em piscinas, baladas, parques e ruas. No seu país, eu adoro a Praia de Copacabana e a rua 25 de Março. Aquelas pessoas com as máscaras abaixo do nariz. Coisa linda! Os narigões respirando, aspirando e espirrando vírus para todos os lados!

Pergunta – Quais são os seus planos para o futuro?

Sars – Entrar para o tráfico de drogas. Ou montar uma indústria farmacêutica, talvez.

 

* Bruno Blecher é jornalista, especializado em agronegócio e meio ambiente. Trabalhou como repórter no jornal O Estado de S. Paulo, foi editor de agronegócio no Agrofolha, da Folha de S. Paulo, do Guia Rural, da Editora Abril, diretor de redação da revista Globo Rural por dez anos e comentarista de agro da rádio CBN. Atualmente é sócio da Agência Fato Relevante e diretor editorial do Estúdio Agro. Fez sua estreia na literatura em 2020, com o livro de crônicas Cidade de papelão, lançado pela 11 Editora.

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